O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) começará a notificar, a partir da próxima terça-feira (13), cerca de 9 milhões de aposentados e pensionistas que tiveram descontos associativos realizados diretamente na folha de pagamento, entre março de 2020 e março de 2025. A medida faz parte de um esforço da autarquia para apurar cobranças irregulares e viabilizar o ressarcimento dos valores descontados sem autorização dos beneficiários.
A comunicação será feita exclusivamente pelos canais oficiais do INSS — o aplicativo e site Meu INSS e a central telefônica 135. O presidente do instituto, Gilberto Waller, destacou ao site Agência Brasil que os beneficiários poderão visualizar os nomes das associações e os respectivos valores descontados. A partir de quarta-feira (14), será possível indicar, de forma simples, se houve autorização para os descontos.
“O cidadão poderá afirmar que não reconhece o valor, sem necessidade de apresentar documentos ou preencher formulários. Basta clicar ou informar que não autorizou a dedução”, explicou Waller em coletiva de imprensa no Palácio do Planalto.
Caso o desconto não seja reconhecido, o sistema do INSS notificará automaticamente a associação responsável, que terá 15 dias úteis para comprovar o vínculo e a autorização do beneficiário. Se a entidade não apresentar a documentação, deverá devolver os valores por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU). O INSS, por sua vez, fará o reembolso ao segurado por meio de folha suplementar.
Se a associação não comprovar o vínculo nem fizer o pagamento, o caso será encaminhado à Advocacia-Geral da União (AGU) para cobrança judicial.
Além dos 9 milhões de notificados por descontos, outros 27 milhões de segurados já estão sendo informados que não sofreram qualquer dedução associativa. “É uma forma de tranquilizá-los”, afirmou Waller.
A estimativa de quando os primeiros ressarcimentos ocorrerão ainda não foi divulgada. “Nossa ideia é primeiro quantificar os casos irregulares”, disse o presidente do INSS, que também reforçou que a comunicação será direta com o segurado, sem intermediários. “Ninguém está autorizado a falar em nome do INSS.”
A iniciativa atende a uma determinação do presidente Lula, segundo Waller, para garantir que nenhum aposentado ou pensionista sofra prejuízo em razão de cobranças indevidas.
Entenda o caso da fraude do INSS
A Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU) deflagraram em meados de abril a “Operação Sem Desconto”, relacionado a um esquema de fraudes no INSS com prejuízo estimado em R$ 6,3 bilhões desde 2019 (ainda na gestão do governo Bolsonaro).
O esquema envolvia cobranças indevidas feitas por associações e sindicatos diretamente nos benefícios de aposentados e pensionistas, sob a justificativa de oferecer supostos benefícios como assistência jurídica, descontos em academias e planos de saúde — a maioria nunca entregue.
A operação resultou na exoneração imediata do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, após pedido da PF e pressão do Palácio do Planalto. Stefanutto, filiado ao PDT, havia sido indicado ao cargo pelo ex-ministro da Previdência, Carlos Lupi, também do PDT, e integrava o grupo de transição do governo Lula na área da Previdência.
Além de Stefanutto, cinco outros servidores foram afastados, incluindo quatro com cargos estratégicos no INSS e um policial federal. Durante as investigações, a PF cumpriu 211 mandados de busca e apreensão em 14 estados, apreendendo carros de luxo como Ferrari e Rolls-Royce, joias, dinheiro vivo e obras de arte — bens que somam mais de R$ 1 bilhão.
Auditorias feitas em 2023 com 29 entidades conveniadas ao INSS mostraram que 98% dos aposentados não haviam autorizado os descontos, e muitos sequer sabiam da existência dessas cobranças, que variavam entre R$ 30 e R$ 50 por mês. Além disso, 72% das entidades não apresentaram a documentação exigida pelo INSS e usaram assinaturas falsas para efetuar os débitos.
Entre as 11 entidades inicialmente investigadas está o Sindicato Nacional dos Aposentados (Sindnapi), cujo vice-presidente é Frei Chico, irmão do presidente Lula — o que acendeu um alerta dentro do governo e do PT. A cúpula do partido teme que a investigação tenha novos desdobramentos.
Os investigados podem responder por crimes como corrupção ativa e passiva, falsificação de documentos, violação de sigilo funcional, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A oposição já articula a criação de uma CPI no Congresso para aprofundar a apuração. O governo federal afirmou que pretende ressarcir os beneficiários prejudicados utilizando parte dos bens apreendidos na operação.