Quem imagina que Trump enlouqueceu ao impor um tarifaço bizarro ao mundo e em particular à China, não entende nada de fundamentos e estratégia econômica. Esse protecionismo tem muita lógica e para Donald, pouca importa a recessão que isso pode causar ao mundo. Um olhar mais atento e criterioso vai perceber os benefícios tentados no médio e longo prazo, bem como as contradições dessa medida radical dos EUA e seu way of life.
A CIA já constatou que a China é a maior ameaça militar e cibernética aos EUA, e que o país será desbancado como potência até 2030. Falta pouco para o PIB chinês superar o estadunidense. Com a hegemonia ameaçada, o Império contra ataca com o TARIFAÇO, rasgando toda política imposta pelos EUA na Globalização. Essa política desindustrializou o Brasil e nos tornou, prioritariamente, meros vendedores de comodities, mas beneficiou a China que, no meu entendimento, soube levar a sério a teoria da dependência de FHC e Enzo Faletto. Liberaram mão de obra barata, quase escrava, para atrair as corporações capitalistas, porém, diferente do Brasil neoliberal de FHC, estabeleceu regras como o controle de patentes após dez anos. Isso permitiu ao país desenvolver alta tecnologia e hoje como a segunda potência mundial, ameaça o poderio econômico e militar do Tio Sam.
Para frear a corrida da China de ocupar o primeiro lugar no pódio da economia mundial, Trump faz o mesmo que Alain Prost fez no Grande Prêmio de Suzuka, no Japão em 1989, quando bateu, propositalmente, em Ayrton Senna, para impedi-lo de ser campeão mundial. Mas, assim como na Formula 1, a China está reagindo. No ano seguinte foi a vez de Senna dar o troco, batendo em Prost e com isso, ganhar o bicampeonato. Portanto, os EUA não perdem por esperar pelo troco chinês.
O endividamento dos EUA atingiu 36 trilhões e 200 bilhões de dólares (124% do PIB) em 2024. O pagamento anual dos juros atingiu um trilhão e 300 bilhões de dólares. Esse montante superou, pela primeira vez, os gastos com a defesa. Para piorar, o déficit fiscal em 2024, foi de um trilhão e 800 bilhões de dólares, o equivalente a 6,4% do PIB, maior percentual dos últimos 50 anos. Boa parte desse desempenho negativo tem relação direta com o déficit da balança comercial sob a bagatela de um trilhão e 200 bilhões de dólares. Esse é o resultado da globalização neoliberal imposta pelos EUA ao mundo. Estão sendo engolidos pelo monstro que criaram. O problema é que o capitalismo carcomido pode partir para sua histórica estratégia, promover uma nova guerra mundial com destruição de forças produtivas para depois ganhar fôlego na reconstrução. Mas é sempre bom lembrar do vaticínio de Einstein: “Não sei como será a terceira guerra mundial, mas se a quarta ocorrer, será com paus e pedras”.
Para inviabilizar o déficit na balança comercial, nada mais de acordos multilaterais com países em bloco. Agora terão que ser bilaterais e com superavit aos EUA. O tarifaço é o “bode na sala”. Trump acredita que o encarecimento provocado pelas novas tarifas, levará os capitalistas a reindustrializar o país, com investimentos bilionários, retomando empregos e gerando impostos. Interessante é perceber a euforia do sindicalista, Shawn Fain, líder do sindicato de trabalhadores da indústria do automóvel (United Auto Wokers) sobre as medidas de Trump ao afirmar que o presidente estava “se esforçando para acabar com o desastre do livre comércio que devastou as comunidades da classe trabalhadora durante décadas”. Porém, o dito cujo omite o fato das pressões que vão recair sobre os trabalhadores para reduzirem seus salários e assim, assegurar a competitividade destes investimentos, já que os custos nos EUA são bem mais elevados em relação a outros países.
Trump já admitiu publicamente que a transição rumo à “América Great Again”, vai gerar sofrimentos, e com isso, reproduz o ditado popular, “depois da tempestade vem a bonança”. Como um exímio e duro negociante, ele quer assegurar aos EUA, maior poder de barganha aos acordos bilaterais e os trabalhadores autóctones que se submetam a flexibilização de direitos e salários com a promessa de nova grandeza. O problema é combinar com os russos, porque as medidas tem efeitos colaterais, como a possibilidades real de desemprego e inflação.
A contenção pensada guarda relação direta com a expulsão dos imigrantes e com os cortes de programas assistenciais mantidos pelo governo. Um bilhão de dólares foram retirados dos bancos de alimentos em março. Isso empurra 44 milhões de estadunidenses, segundo dados da Feeding América, para a situação de insegurança alimentar. A estratégia é substituir os imigrantes expulsos por essa gama de famintos que vai emergir e vai aceitar as vagas que antes rejeitavam e eram exercidas pelos imigrantes. Fora isso, há um projeto de lei republicano que permitirá aos menores entre 14 e 17 anos trabalharem mais de 30 horas por semana, serão empregados em turnos noturnos e poderão suspender a participação nas aulas em função das necessidades do empregador. Tudo está milimetricamente pensado.
A América Grande do futuro demanda sofrer agora para gozar depois. Essa é uma velha tática conhecida dos brasileiros com a estória da carochinha da Ditadura Militar sobre “deixar o bolo crescer para depois dividir”, ou seja, primeiro o crescimento econômico e depois a distribuição de renda que nunca veio antes dos governos Lula.
Em 2026, esse projeto diabólico passará pelo crivo do eleitorado estadunidense. Será a hora da verdade, se Trump é farsa ou tragédia, conforme a ideia de Karl Marx sobre repetecos históricos. Afinal, há um realinhamento comercial dos países com relação aos EUA. Indicadores mostram que as exportações e o turismo estão despencando, corporações estadunidenses ao invés de ficarem ou retornarem ao país, como a Apple, anunciam investimentos bilionários no Brasil e em outros países do mundo. A palavra de ordem mundo afora é BOICOTE como retaliação aos EUA. Pesquisas indicam a queda precoce de Trump. Eleito com 51% dos votos, hoje tem quase 60% de desaprovação em apenas 3 meses. Nesse ritmo, o Partido Democrata deve se tornar maioria na Câmara e no Senado, o que pode levar o projeto trumpista para o cadafalso.
Uma resposta
Acho que estamos caminhando para um neo feudalismo econômico. Onde o meta capitalismo vai se refugiar não mais em territórios convencionais e apoiados por estados mas sim na personificações das mega corporações como Musk, Bezos, Jack Ma, Larry Page e muitos outros que foram precedidos por Gates. Senhores criadas pela internet que prometia a liberdade, mas foi principalmente usada para concentrar o capital. esses serão os novos senhores feudais. eles controlam as economias, tanto a mundial quanto as locais de acordo com seu interesse. essas tarifas são como os pedágios que pagavam-se ao passar de um feudo ao outro. novamente o mundo se ocidentaliza retroativamente falando.